Dia de Hoje 8
8
2021/10/06
Há alguns anos
Sentava-me num banco
A falar com Pascoaes
De bronze.
Curioso perguntei,
Àquele bronze,
De olhar sempre posto
No pequeno horizonte que lhe deram,
Que via ele
Para além do casario.
Uma resposta
Caiu no meu pensamento.
Que não olhava o casario,
Apenas mirava no céu
As imagens sem fim
Que o vento desenhava
Com as nuvens
No infinito azul.
Deitei-me naquele banco,
Onde depois me deitei muitos outros dias.
Vi Veleiros,
Vi leões, hipopótamos, elefantes,
Continentes, ilhas, penínsulas, nações,
Deuses, anjos e demónios,
Rostos e máscaras.
Todas estas imagens
Pintadas do cinzento-escuro ao claro
Por um vento forte,
Ou por ligeira brisa.
Num dos anoiteceres,
De Domingo, após Domingo,
Vi,
Entre pequenos farrapos cinzentos,
Pétalas derramadas por planta incógnita,
Um corpo humano.
Não estava colorido
De branco e cinza
Como as outras imagens.
Era rosa-transparente
Colorido pelo sol-poente.
Tão translúcido,
Tão transparente,
Que se via,
Por entre a matéria do corpo,
O sofrimento imenso
De uma alma profunda.
Zé Onofre